sábado, 8 de janeiro de 2011

MINAS É A MÃE.


MINAS É A MÃE.
BENÇA, MÃE.
O jeito mineiro de ser é o quê? E por quê? P ser mineiro é um modo particular
de ser que pode ser descrever mas que é difícil de se entender. É mais para
calado que falante. Quem fala muito dá bom-dia a cavalo, dizia minha mãe
para conter meu ímpeto falatório. Quem fala se expõe, se arrisca, pode parecer
bobo, meio idiota, exibido, ridículo. Mineiro morre de medo do ridículo, de ser
gozado, criticado.
Quer matar um mineiro? Ria dele! Por isso todo mineiro toma a iniciativa da
gozação. Chega, fica num canto e arranja logo alguém para gozar. É capaz até
de tomar a iniciativa de gozar de si próprio para não ser gozado por outrem.
Falar mal de alguém é um modo de se proteger da fala do outro. Mas falar mal
pode até ser um modo de falar bem, porque o pior é não ser falado. Cair no
olvido.
Fica calado e fica quieto. Gesticular também não dá, pode parecer espalhafato,
teatro, representação. Quem se mexe desperta atenção, instiga a caça, fica
vulnerável, na mira do ataque. Ficar quieto, fingir de morto, no silêncio, na
tocaia de si mesmo, protegido do outro. Mineiro que veio do mato sabe de caça
e caçador. Milton já cantou, o caçador de mim.
Mineiro não abre a guarda, não mostra a casa, não exibe riqueza, não grita da
janela, não sai correndo de jeito nenhum e de lugar nenhum. Chega devagar,
fica devagar e são mais devagar ainda. Tem que se proteger de algo.
Mineiro olha de cima mas não por cima. Mineiro falante veio de fora. Mineiro
direto, aberto e agressivo é desvio de rota, não é o caminho normal. Mineiro é
ético, não se arrisca no roubo, no assalto, na aventura. O erro pode não dar
certo. Mineiro é mais da ordem, do caminho percorrido, conhecido,
estabelecido. É mais
manga curta, mais sapato que tênis, mais automóvel que carro esporte. Mais
casamento que caso fora de casa. Mais café preto que chás variados.
Já a maneira é tudo isso que mineiro é e muito mais. Se pede com olhar, se
esconde com recusa. É mão mesmo quando não tem filhos. Até os 20 é um
pecado. Depois é muito mais. Transpira todos os pecados numa virtude só.
Surpreende e depois te esquece. Te ama com paixão e te deixa sem dó nem
piedade. Vasta pôr os óculos escuros ou mesmo
remorso. Porque a mineira não se reduz ao mineiro, foi muito além. Maneira é
ótima, diferente dos demais seres humanos, vem de um fundo que ninguém
sabe, de um interior que não tem mapa, fronteiras desconhecidas.
E tudo isso pode ser visto e sentido, não explicado. Pode ser descrito mas não
fundamentado. É porque veio do interior ou nunca saiu de lá. É porque sempre
foi camponês e se escondeu detrás das serras e dos montes. É porque foi
judeu-novo, migrante corrido, foragido desconfiado do que chega atrás de suas
origens. É porque teme a Deus e conversa com o Diabo. É porque não tem
certeza do certo e duvida do duvidado. Gosta do reverso e começa tudo pelo
contrário torcendo para dar certo. É porque se ri do moderno porque sabe que
tudo no fundo mesmo é mesmo muito antigo, sempre renovado.
Mas por que tudo isso, de onde veio e para onde vai? Ninguém vai saber por
que não se fala, se olha e se ri como se tudo já tivesse sido dito. O sabido do
ignorado.
Se um dia o Brasil acabar, Minas continua. Tem Horizonte para tal, tem
substância para dura, tem ainda muitos casos para contar, distâncias a
percorrer, pecados a explicar, contas a fazer, saudades a matar. (...)
Minas vive em dívida consigo mesma, fazendo promessas para pagar. É sua
forma de ser eterna nesse trivial do cotidiano. Vive sangrando minério,
exportado seu ser para o mundo, em silenciosos trens que não param de ir
sem nunca mais voltar. Levando Itabira, Conselheiro Lafaiaete. Montanhas.
Minas é o quinto lugar do mundo que exporta montanhas e não fica rica.
Por tudo isso é que quando tenho vontade de rever o Brasil vou a Minas Gerais
(...) E volto cheio de mim, carregado de coisas, como se tivesse mergulhado no
tempo e me perdido no espaço, virado de repente um ser planetário vivendo no
interior do mundo.
Minas para mim tem várias cidades e poucos endereço: é Bocaiúva, Neves e
Belo Horizonte. É rua Ouro Preto e Ceará. A primeira mudou de nome, na
segunda sumiram com minha casa. Minas na verdade hoje é mil amigos que
não vejo e minha mãe. Bença, mãe.
Hebert de Souza - Sociólogo
ray-ban que vira outra, sem
status quo que mudança de status. É mais terno que

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